(…) a rainha recebe-o, ouve distraidamente o relato da passagem do consorte por Bruxelas. João Baptista, orador prolixo, valoriza a sua própria contribuição para o evento, reivindica influências em Bruxelas e intimidades na corte, sugere promoções, melhoria de estado, veneras, talvez recompensas, tenta adivinhar as reacções de Sua Majestade. Esta mal se apercebe do que o súbdito pretende: é bela, caprichosa, quase uma criança, só pensa no marido prestes a chegar, na cerimónia do casamento religioso, na mudança de vida que a espera. Garrett é - sabe-o vagamente - o encarregado de negócios em Bruxelas, um poeta que serviu o pai, um dos muitos portugueses que, como ela própria, andaram de exílio em exílio, da casa de Anás para a casa de Caifás, e agora aguardam a paga dos feitos cometidos e imaginados. Os Ficalhos, os chamorros, os cortesãos, o próprio Palmela, todos se referiam à peculiar maneira de vestir desse Garrett - ela dizia Garretti, à maneira brasileira -, aos costumes excêntricos do poeta e da mulher, ao despesismo do casal, à moralidade pouco convencional de ambos. "Mais poeta do que diplomata, mais dandy do que gentleman, mais parisiense do que britânico" - assim o caracterizara Palmela e, entre distraída e enfadada, a rainha admite a justeza do retrato feito pelo seu ministro favorito.
(Amadeu Lopes Sabino, A Lua de Bruxelas, Campo das Letras, 2000, p.115)
um belissimo romance historico a lua de bruxelas, sem duvida...
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