Thursday, January 31, 2013

O Banqueiro Anarquista

Se você andar aí na rua e infelizmente encontramos pessoas que são sem-abrigo, isso não lhe pode acontecer a si ou a mim porquê? Isso também nos pode acontecer", acrescentou durante o encontro com os jornalistas.
"E se aquelas pessoas que nós vemos ali na rua, naquela situação e sofrer tanto aguentam porque é que nós não aguentamos? Parece-me uma coisa absolutamente evidente", rematou o banqueiro.


Ler mais: http://expresso.sapo.pt/ulrich-se-os-sem-abrigo-aguentam-porque-e-que-nos-nao-aguentamos=f783682#ixzz2JZcs1QIt

Wednesday, January 30, 2013

Museus: os mal vestidos em Paris e os nus em Viena


L'histoire est surprenante. Samedi dernier, Matthieu*, un jeune cadre bénévole du mouvement ATD (Agir tous pour la dignité), avait décidé accompagner une famille en situation de grande précarité visiter le Musée d'Orsay. Après les avoir emmenés déjeuner au restaurant du musée, «où le personnel s'est montré charmant et prévenant», précise Matthieu, le bénévole a ensuite accompagné le couple et leur jeune garçon d'une dizaine d'années déambuler parmi les statues. C'est en sortant de la salle très prisée où sont exposées les peintures de Van Gogh qu'un gardien les apostrophe et leur demande de bien vouloir quitter le musée, parce que «des visiteurs se sont plaints de (leur) odeur»… Refus du bénévole, qui objecte que leur tenue est décente, qu'ils ne gênent personne, et que rien dans le règlement intérieur du musée ne semble pouvoir les y obliger. Néanmoins, le petit groupe se dirige vers la section Art nouveau, de grandes salles peu fréquentées. C'est en sortant de ces salles que quatre agents encadrent Matthieu et la famille, «nous intimant l'ordre de partir, sans ménagement». N'en revenant pas, ce n'est qu'une fois sorti du musée que le bénévole demande des explications aux agents, exigeant de savoir qui a donné cet ordre indigne d'expulser et d'humilier cette famille, déjà éprouvée par la vie et habituée à se sentir exclue. (LE FIGARO, 29/1)


A exposição Nackte Männer [Homens Nus], inaugurada em Outubro de 2012 no Museu Leopold, em Viena, deveria ter encerrado no dia 28 de Janeiro, mas continua a atrair tantos visitantes – já foi vista por cerca de 400 mil pessoas – que a direcção do museu austríaco decidiu prolongá-la até 4 de Março.
Acedendo a alegadas solicitações de associações nudistas, o Museu Leopold vai ainda reservar um dia para aceitar visitantes despidos. No dia 18 de Fevereiro, a partir das 18h00, quem quiser ir nu ver os nus está, por assim dizer, à vontade. (PUBLICO, 30/1)

Monday, January 28, 2013

A Jovem Guarda (ilustração musical)

A Jovem Guarda

"Carlos Peixoto, um deputado eleito pelo círculo da Guarda, descobriu que Portugal está a envelhecer, facto a que ele se refere desta maneira: "A nossa pátria foi contaminada com a já conhecida peste grisalha"

E quando virem que também trazemos a cólera e o bacilo de Koch... A eles, velhada!

Sunday, January 27, 2013

Salvar o cão Zico

A Segunda Emenda Constitucional permite a qualquer cidadão norte-americano comprar (no supermercado ou pela internet) e deter em sua casa as mais sofisticadas e letais armas de guerra.

Não é obviamente por culpa das armas que ocorrem massacres! Que mil armas crepitem, pois, nos lares, mercados e escolas americanos!

A lei portuguesa tolera que qualquer cidadão tenha em casa, para seu deleite e companhia, os mais ferozes e perigosos cães de raça, definidos como assassinos, normalmente usados como cães de fila ou para esse saudável desporto que é a luta de cães.

Não é obviamente por culpa dos cães que estes se viram contra as crianças e as matam! Que mil pitbulls ladrem, que mil rotweillers rosnem por todas as terras e casas portuguesas!

Downton e Zico, mesmo combate!

Não teria havido massacre em Downton se todos os alunos andassem armados. A criança não teria morrido se não tivesse tido o desplante de pisar o pobre Zico!


Bem vindo ao Centro Norte-Sul do Conselho da Europa!


Saturday, January 26, 2013

Economistas sem lei

Em Espanha, um economista, consultor de um partido político, e muito bem pago por sua consultadoria, convenceu o partido seu empregador a passar a pedir textos e pareceres sobre determinados temas a uma grande especialista americana, uma sumidade na matéria, que, evidentemente, teria de ser muitíssimo bem remunerada pelas suas doutas opiniões.

Ao fim descobre-se que a eminente americana não existe, que todos os doutos pareceres eram feitos pelo mesmo economista ou, segundo que ela própria alegou, por sua mulher, que os considerava "estimulantes exercícios intelectuais".

Este honrado economista, depois de despedido do partido que burlou, veio integrar uma equipa para dar pareceres em nome do FMI a um país sob resgate.

Que país? Que pergunta!



Leituras

"Décidément, ce néocolonialisme a beaucoup plus d'adversaires farouches et déterminés que le colonialisme lui-même... C'est moins risqué. Je crois me souvenir que durant la guerre d'Algérie les anticolonialistes étaient moins nombreux qu'aujourd'hui."

(Jacques Julliard, Marianne de hoje)

Dedicado ao zelo politicamente correcto e modernaço contra o nosso perigoso neocolonialismo lusófono!

Thursday, January 24, 2013

Dies ist kein Land fur alte Manner

"Eu tenho muita solidariedade e simpatia para com os portugueses, em particular com as gerações mais novas", disse ainda o chefe da diplomacia do governo de Angela Merkel. 

Mais Eça

"-Talento robusto, disse o Conselheiro.
 -Sim, pujante!"


O economista e consultor para as privatizações do Governo António Borges afirmou nesta quinta-feira que Portugal já tem “a economia equilibrada” e que não precisa de mais medidas de austeridade. Porém, António Borges aponta para a necessidade de se reduzir o défice do Estado através de um corte na despesa.


O Suave Milagre


Portugal, com duas longas lagrimas na face magrinha, murmurou:
- Oh Ângela! O Mercado ama todos os pequeninos. E eu ainda tão pequeno, e com um mal tão pesado, e que tanto queria sarar!
E Ângela, em soluços:
- Oh meu filho, como te posso deixar? Longas são as estradas da Europa, e curta a piedade dos homens. Tão rota, tão trôpega, tão triste, até os cães me ladrariam da porta dos casais. Ninguém atenderia o meu recado, e me apontaria a morada do doce Mercado. Oh filho! talvez o Mercado morresse... Nem mesmo os ricos e os fortes o encontram. O Céu o trouxe, o Céu o levou. E com ele para sempre morreu a esperança dos tristes.
De entre os negros trapos, erguendo as suas pobres mãozinhas que tremiam, a criança murmurou:
- Mãe, eu queria voltar aos mercados...
E logo, abrindo devagar a porta e sorrindo, o Mercado disse à criança:
- Aqui estou.

(com as devidas desculpas  a Eça de Queirós) 

Monday, January 21, 2013

Leituras

O artigo de António Pinto Ribeiro (Para acabar de vez com a lusofonia, Público, Ípsilon, passado dia 18) é uma passagem superficial e arrogante pelos lugares comuns pós-coloniais mais batidos, com o objetivo de denunciar uma lusofonia que nunca foi o que ele diz.

Um pouco mais de estudo ficava-lhe bem. Até para defender essas posições. Não basta ler a correr o livro da Cláudia Castelo e fazer uma genuflexão obrigada ao Appadurai... 

Sunday, January 20, 2013

Ode para o futuro

Ode para o FuturoFalareis de nós como de um sonho. 
Crepúsculo dourado. Frases calmas. 
Gestos vagarosos. Música suave. 
Pensamento arguto. Subtis sorrisos. 
Paisagens deslizando na distância. 
Éramos livres. Falávamos, sabíamos, 
e amávamos serena e docemente. 

Uma angústia delida, melancólica, 
sobre ela sonhareis. 

E as tempestades, as desordens, gritos, 
violência, escárnio, confusão odienta, 
primaveras morrendo ignoradas 
nas encostas vizinhas, as prisões, 
as mortes, o amor vendido, 
as lágrimas e as lutas, 
o desespero da vida que nos roubam 
- apenas uma angústia melancólica, 
sobre a qual sonhareis a idade de oiro. 

E, em segredo, saudosos, enlevados, 
falareis de nós - de nós! - como de um sonho. 

Jorge de Sena, in 'Pedra Filosofal'

Sobre a Índia


Enquanto português a Índia marcou-me, não enquanto descoberta de mim através do outro (como me aconteceu no Brasil), mas como descoberta dessa "essencial heterogeneidade do ser" de que falava um poeta espanhol de que muito gosto (António Machado) essa heterogeneidade que está tão próxima, tão intimamente próxima, da nossa própria identidade. 

E agora penso que a questão deveria ser posta ao contrário: o que é que não me marcou na Índia? É difícil falar da Índia, quando se cola a tudo o que dizemos o lastro de tantos discursos, tantos olhares, tantas interpretações pelas quais tentámos, tanto nós ocidentais como vós indianos (sim, porque também há "orientalistas" no Oriente), resumir a uma fórmula, a uma interpretação, a um tratado esse "múltiplo esplendor" (gosto de citar este lugar comum da Han Suyin) pelo qual a Índia se esconde e se revela num mesmo movimento aos nossos sentidos. 

Apetecia-me falar do coração. Mas começo pela cabeça e, seguindo a lição de um clássico português, o Camilo, não esquecerei o estômago. A razão de ser da Índia moderna é evidentemente tomar o seu devido lugar no mundo com todo o peso da sua força, da sua capacidade, da sua riqueza e da sua inteligência. Mas o coração não esquece as mulheres violentadas nos autocarros de Deli, os dalits humilhados às portas das cidades ou a ternura de um inesperado olhar vindo de dentro do bairro da miséria. E o estômago: a fome combatida por esses milhões de camponeses, sem rentabilidade para os cálculos económicos modernos, mas sem alternativa à vista para os estômagos vazios. 

A modernidade e a inteligência mais sofisticada podem coincidir assim com a barbárie? Mas isso não é exclusivo da Índia, como por demais sabemos. Walter Benjamin dizia que "todo o monumento de civilização é ao mesmo tempo um monumento de barbárie". Grutas de Ajanta ou Capela Sistina, os escravos e os humilhados passaram por lá  e a sua sombra pesa na memória dos vencidos. Invasões mogóis ou ocupações portuguesas, guerras inglesas, colonizações, massacres ao fio da espada, o som e a fúria da História perduram na música obsessiva da memória. Mas eu não fui à Índia para participar na genuflexão ritual dos colonizadores ante os colonizados. Aliás poucos já se preocupam hoje na Índia com esse assunto. Quando a Europa se provincializa, certas erupções anti-coloniais têm o ridículo e o encanto de rendas velhas guardadas num cofre de cânfora. Afinal quem são hoje os colonizados?

Eu vi os pescadores de Goa escoltarem, com flâmulas vermelhas e verdes nos seus barcos, o nosso navio-escola "Sagres", que viera em visita oficial à Índia, a convite da Marinha indiana. Fizeram-no, não para sonhar com o regresso das caravelas, mas para afirmar publicamente que não queriam negar o passado. Ideia que aliás nunca ouvi a qualquer autoridade indiana em Nova Deli: bem pelo contrário, ouvi o Primeiro Ministro Manmohan Singh reconhecer publicamente o legado histórico de Portugal na Índia. E é isso que conta. 

Contrariamente ao que alguns desejariam, os escravos não se tornaram senhores para os senhores se tornarem escravos. De certo modo compreendemos hoje que somos todos, ao mesmo tempo, senhores e escravos: senhores, sim, da experiência extraordinária de globalmente nos conhecermos e de num mesmo instante nos tratarmos; escravos, sim, de um universal sistema de instantâneos efeitos, que atravessa espaços e nações e apenas conhece relações de força e diferenciais de riqueza. A cultura, poderemos dizer então, é o monumento que responde à nossa barbárie? Eu vi o sorriso elegante de Shiva na Ilha de Elefanta e o olhar apiedado de Nossa Senhora na Igreja Matriz de Pangim. De um olhar ao outro é o mais comum dos humanos que enfrenta, com uma misteriosa ironia, os avatares da História e o orgulho dos homens. 

(Resposta a uma pergunta da Lusophone Society of Goa)

Wednesday, January 16, 2013

Leituras

Os artigos de Perry Anderson no "London Review of Books" sobre os chamados países  emergentes (Índia o ano passado e agora o Brasil) são de uma extraordinária lucidez e sentido crítico, esteja-se ou não de acordo com todas as (por vezes provocatórias) teses do autor.  À atenção dos que perceberam que se vivemos tempos pós-imperiais é justamente porque vivemos tempos em que a Europa se está a tornar cada vez menos central no Mundo.

Tuesday, January 15, 2013

Tratem da fama e do comer

Gazetilha

( Álvaro de Campos )


Dos LLOYD GEORGES da Babilónia
Não reza a história nada.
Dos Briands da Assíria ou do Egito,
Dos Trotskys de qualquer colónia
Grega ou romana já passada,
O nome é morto, inda que escrito.

Só o parvo dum poeta, ou um louco
Que fazia filosofia,
Ou um geómetra maduro,
Sobrevive a esse tanto pouco
Que está lá para trás no escuro
E nem a história já historia.

Ó grandes homens do Momento!
Ó grandes glórias a ferver
De quem a obscuridade foge!
Aproveitem sem pensamento!
Tratem da fama e do comer,
Que amanhã é dos loucos de hoje!

Monday, January 14, 2013

O burro e o leão

José Manuel Fernandes, antigo diretor do "Público", escreveu no seu twitter: "O dr. Mário Soares não deveria ter ido para um hospital do SNS para dar o exemplo? É só para saber, nada mais."
Não vou aqui elaborar sobre o direito de qualquer cidadão se bater pelos serviços públicos e usar, se assim entender, serviços privados. Não é o momento. O que me choca, o que me deixa mesmo próximo do vómito, é alguém aproveitar um momento destes para fazer combate político. Quem aproveita a hospitalização de um homem para o combate político, quem aproveita a fragilidade física de um adversário para o atacar, tem apenas um nome: é um cobarde. E com cobardes não se debate. Desprezam-se apenas.
 
(Daniel Oliveira)

Saturday, January 12, 2013

Un ami m'a dit...


« Il faut prendre en compte l’effet de confiance [que ressentent les marchés] » vient de déclarer hier à Bruxelles Olli Rehn, le commissaire aux affaires économiques et monétaires, afin d’exprimer son désaccord avec l’étude du FMI confirmant l’analyse d’Olivier Blanchard d’octobre dernier. Ce dernier appelle les autorités européennes à lever un peu le pied dans l’application de l’austérité budgétaire et à tempérer les contraintes imposées aux pays les plus lourdement endettés. Moins ésotérique mais non sans jésuitisme, Mario Draghi, le président de la BCE, expliquait le même jour à Francfort que « de si grands progrès accompagnés de sacrifices si importants ont déjà été accomplis qu’il ne serait pas bon de revenir à une situation qui a déjà été jugée intenable ». Comme si la question était posée…
Le rideau s’est levé sur un débat devenu public et il ne va pas retomber. Il y a malaise à propos d’une stratégie de désendettement qui n’opère pas sa magie et renvoie ses effets à bien plus tard. En visite à Lisbonne, Martin Schulz, le président du Parlement européen, a ouvertement mis en évidence les contradictions qui apparaissent, cette fois-ci au sein du FMI. Ce dernier vient de préconiser d’un côté un renforcement important des mesures d’austérité au Portugal, tout en admettant de l’autre que trop de rigueur freine la croissance. La sortie de Schulz s’est accompagnée d’un commentaire : « Ils semblent ressortir une vieille recette qu’ils estimaient pourtant mauvaise », et d’une suggestion « je propose au FMI de commencer par se mettre d’accord sur ce qu’il estime être la meilleure solution ».
(François Leclerc, no blog de Paul Jorion)

De Senectude (2)


                                                (Vincent Van Gogh)


Usei de mim o que não tinha de melhor
e o melhor que havia em mim nunca cheguei a entender.
Hoje apercebo sombras
e a minha memória erra entre imagens difusas
e palavras ríspidas.
Quem me dirá o que fui? 
  

Citação do dia


The best lack all conviction, while the worst
Are full of passionate intensity.

(William Butler Yeats)

Thursday, January 10, 2013

De Cora Rónai


Da coluna de Cora Rónai no "Globo", com um "abraçaço" para ela:
O Facebook deu de fazer perguntas aos usuários. Agora mesmo me perguntou como eu estava me sentindo, mas não lhe fiz caso. A ideia é, suponho, dar um empurrãozinho nos novatos que não sabem ainda se comunicar na rede social. O truque, que funciona nos EUA, de onde foi importado, não dá certo entre nós, latinos, que não carecemos de assunto. O resultado é que a maioria das pessoas responde, quando responde, com maus modos e irritação. Mas há quem responda com humor e elegância, como o poeta e diplomata português Luis Filipe de Castro Mendes, que há alguns anos serviu como cônsul aqui no Rio:
“Ainda bem que pergunta. Realmente ninguém tem interesse em saber como eu me sinto (rabujento, irritado com as notícias, saudoso do futuro, esfíngico e fatal, com os pés frios, acabrunhado pela miséria do mundo, já com um bocado de sono, cheio de fome e de sede de infinito, tenebroso, belo, inconsolável, contribuinte sem dívidas ao fisco, um pouco blasé, príncipe de Aquitânia com a torre abolida, lúcido, merda, lúcido, com a televisão já desligada, caminhando radioso sobre a minha miséria, se quiserem continuo…). E é isto, só o Facebook quer saber como me sinto. Ninguém mais. Nem eu.”
(O Globo, 10.1.2013)

O nada que é tudo


Poema em Linha Recta' de Álvaro de Campos


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus amigos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso, arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico às criadas do hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,


Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado,
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida…


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste mundo que me confesse que uma vez já foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Álvaro de Campos

Quando nada mais fica


            ODE À INCOMPREENSÃO


De todas estas palavras não ficará, bem sei,
um eco para depois da minha morte
que as disse vagarosamente pela minha boca.
Tudo quanto sonhei, quanto pensei, sofri,
ou nem sonhei ou nem pensei
ou apenas sofri de não ter sofrido tanto
como aterradamente esperara -
nenhum eco haverá de outras canções
não ditas, guardadas nos corações
alheios, ecoando abscônditas ao sopro do poeta.

Não por mim. Por tudo o que, para ecoar-se,
não encontrou eco. Por tudo o que,
para ecoar, ficou silencioso, imóvel -
- isso me dói como se ausência a música
não tocada, não ouvida, o ritmo suspenso,
eminente, destinado, isso me dói
dolorosamente, amargamente, na distância
do saber tão claro, da visão tão lúcida,
que para longe afasta o compassado ardor
das vibrações do sangue pelos corpos próximos.

Tão longe, meu amor, te quis da minha imperfeição,
da minha crueldade, desta miséria de ser por intervalos
a imensa altura para que me arrebatas
- meu palpitar de imagem à beira da alegria,
meu reflexo nas águas tranquilas da liberdade imaginada-,
tão longe, que já não meus erros regressassem
como verdade envenenando o dia a dia alheio.

Tão longe, meu amor, tão longe,
quem de tão longe alguma vez regressa?!

E quem, ó minha imagem, foi contigo?

(De mim a ti, a mim,
quem de tão longe alguma vez regressa?)

Jorge de Sena

Wednesday, January 9, 2013

Gérard Depardieu



"It's odd that people should feel so shocked by Depardieu's decision. After all, in escaping from a messy, expensive democracy to a cheaper and simpler autocracy, the actor is only doing what thousands of Western multinational corporations do every day by moving their factories to China and their management to the United Arab Emirates.

For example, when it invests in China, a company like Apple can reap all the benefits of totalitarianism - streamlined governance, low wages and no labor unrest - at the same time as it opts out of the abuses, restrictions and indignities faced by ordinary Chinese people.

Depardieu has done the same thing."

(Vadim Nikitin,  International Herald Tribune, 9/1)


Apocalypsis cum figuris


                                         (Albrecht Durer, Apocalypsis cum figuris)


Profissões privilegiadas
Segundo o relatório do FMI, elaborado em conjunto com a Comissão Europeia, os salários da função pública são “relativamente elevados” e privilegiam “trabalhadores com baixas qualificações”, uma vez que a diferenciação nos salários acontece em função da antiguidade e não do desempenho. 
O documento refere que há classes profissionais (polícias, militares, professores, médicos e juízes) que têm “demasiadas regalias”, que os médicos têm salários excessivamente elevados (principalmente devido ao pagamento de horas extraordinárias) e os magistrados beneficiam de um regime especial que aumenta as pensões dos juízes em linha com os salários.
Esta é uma das mudanças propostas pelo relatório que, afirma o Jornal de Negócios, o Governo está a analisar. A progressividade dos salários do Estado deve passar a ser feita em função do desempenho e não da antiguidade, como forma de “atrair profissionais mais motivados e qualificados”, como escreve o jornal.
Mexer nas pensões
Uma segunda área de acção encontra-se nas pensões da Caixa Geral de Aposentações, diz o relatório do FMI. Neste campo, a instituição dirigida por Christine Lagarde propõe dois caminhos: a extensão do corte nos subsídios de férias e de Natal conjugado com um segundo corte de 15% nas pensões acima de um valor mínimo (não determinado). Um segundo caminho passa por alterações nas regras de cálculo das pensões.
Diz o FMI que o Estado pode considerar a extensão da idade de reforma até aos 55 anos e a proibição expressa de reformas antes dos 65 anos. O Governo pode ainda estudar a possibilidade de alterar o cálculo do valor das pensões em função das condições orçamentais e assumir um ajuste periódico nestes valores.
Neste sentido, o Estado pode somar um corte de 20% a todas as pensões da Caixa Geral de Aposentações, além das novas formas de cálculo para os pensionistas.
O FMI chama também a atenção para o sistema de protecção social, que diz ser “demasiado dispendioso, injusto,  especialmente para os mais jovens”, defendendo que o “subsídio de desemprego continua demasiado longo e elevado.”
(Jornal de Negócios de hoje)

Leituras para o nosso tempo


A Bíblia dos pobres


                               (Viridiana, Luis Buñuel)

Nesse tempo

    
                     NESSE TEMPO É QUE ERA BOM

Os pobres ficavam à porta à espera que
lhes levassem a comida. Olhavam para dentro da casa, às escondidas,
e viam as paredes de mármore, o chão de azulejos, as escadarias
de pedra, as portas de grandes salões onde nunca iriam
entrar. Quando lhes traziam os restos de comida, embrulhados
em papel, pegavam neles, de olhos no chão, e iam-se
embora sem uma palavra. Nunca soube
se os comiam, às escondidas, para que
outros não tivessem a tentação de lhes roubar
as sobras do banquete; se os levavam para o casebre,
e os partilhavam com os filhos que tremiam de febre,
embrulhados em mantas; ou se iriam ser atacados
pelas matilhas de cães tão esfomeadas como
eles. Os pobres não sabiam o que fazer
com as suas vidas; mas eu sabia o que lhes iria
acontecer de cada vez que ouvia o sino dobrar,
e corria para o cemitério onde o coveiro,
com todo o tempo do mundo, cavava um buraco,
dando tempo ao corpo, embrulhado na manta
grosseira, para arrefecer, até ser deitado na cova.

(Nuno Júdice, Fórmulas de uma luz inexplicável, Dom Quixote, 2012)



Take the money and run

Le beurre et l'argent du beurre

Histoire exemplaire de ce qu’est le capitalisme financier, AIG est aussi en passe de devenir une histoire édifiante ! En 2008, il avait été évité que l’assureur américain, alors leader mondial, sombre brutalement – risquant d’entrainer avec lui de nombreuses banques américaine et étrangères dans le cadre d’une réaction systémique à la portée imprévisible – grâce à l’apport par l’État américain de 182 milliards de dollars sous forme de liquidités et de garanties.
Aujourd’hui, les actionnaires « historiques », d’AIG derrière lesquels se cache son ancien patron et ex-premier actionnaire Hank Greenberg, réclament 25 milliards de dollars au gouvernement, s’estimant lésé en raison des profits réalisés depuis par la Fed et le Trésor dans le cadre de ce sauvetage, soit respectivement 17,7 et 5 milliards de dollars…
Le conseil d’administration d’AIG va discuter aujourd’hui de l’éventualité d’engager également une action, alors que l’entreprise a lancé une grande campagne publicitaire sur le thème « Merci l’Amérique ! » pour remercier de leur sauvetage les contribuables américains. A-t-elle vocation à être un solde de tout compte ?

(do blog de Paul Jorion)

Sunday, January 6, 2013

Aqui a troika não vai ter problemas constitucionais


Depois do surpreendente discurso de Ano Novo, em que abordou o tema da reconciliação com o Sul, soube-se agora que o Presidente da Coreia do Norte está a ser aconselhado por economistas e advogados alemães, que têm como tarefa apontar o caminho para o desenvolvimento da economia do país.
Um dos economistas envolvidos no processo, citado pelo diário alemãoFrankfurt Allgemeine Zeitung, afirma que o regime da Coreia do Norte tem já um "plano director", com o objectivo de promover a abertura económica "ainda este ano".
                                                  (Público de hoje)

Aqui d'El-Rei!




Vasco Pulido Valente (sempre esse homem fatal) no "Público" de hoje:

"Vivendo num mar de ilegalidade desde, pelo menos, 1910, custa perceber como de repente esta extraordinária revelação desceu sobre a cabeça do indígena."

Indígenas: vamos repor a legalidade! Viva El-Rei! Viva a Carta Constitucional! Viva 1909! 

O caderno novo


— É tão belo como a soca
que o canavial multiplica.
— Belo porque é uma porta
abrindo-se em mais saídas.
— Belo como a última onda
que o fim do mar sempre adia.
— É tão belo como as ondas
em sua adiçăo infinita.

— Belo porque tem do novo
a surpresa e a alegria.
— Belo como a coisa nova
na prateleira até então vazia.
— Como qualquer coisa nova
inaugurando o seu dia.
— Ou como o caderno novo
quando a gente o principia.

— E belo porque com o novo
todo o velho contagia.
— Belo porque corrompe
com sangue novo a anemia.
— Infecciona a miséria
com vida nova e sadia.
— Com oásis, o deserto,
com ventos, a calmaria.


(João Cabral de Melo Neto)

Saturday, January 5, 2013

Os Seminários Diplomáticos de antigamente

                                       Hans Holbein, Os Embaixadores

Tuesday, January 1, 2013

Mais um defensor da frieza da solidariedade contra o calor da caridade

O obreiro da paz deve ter presente também que as ideologias do liberalismo radical e da tecnocracia insinuam, numa percentagem cada vez maior da opinião pública, a convicção de que o crescimento económico se deve conseguir mesmo à custa da erosão da função social do Estado e das redes de solidariedade da sociedade civil, bem como dos direitos e deveres sociais. Ora, há que considerar que estes direitos e deveres são fundamentais para a plena realização de outros, a começar pelos direitos civis e políticos.

(Bento XVI)

Bom Ano Novo!