Saturday, December 26, 2015

Estrelas e pirilampos


Tantas luzes se apagam na terra:
como reconhecer os caminhos?
Pois aqui sumiram os vagalumes
e respira o mundo no escuro e depois
o luar emerge sobre rochas vagas
sem distinguir a terra do mar.

Estrelas da Ursa, ajudai os homens
a enfrentar este escuro que vem de dentro!

Depois da festa


Basta olhares-me nos olhos: estão vazios.
Das imagens e das luzes que passaram
ficou o rasto amargo de memórias
que melhor não fossem ditas nem pensadas.
Tu não guardas nada, tu atravessas
as coisas que foram vida e alegria
e no que te demoras há o rasto
do que para sempre sobrou da tua vida.
O fim da festa é sempre um bom momento
para tomares por ti o peso à alegria
e sorrires com os teus olhos: estão vazios.
Nunca teve uma história o que te deram
nem a tua sombra na terra fez o dia.

Friday, December 25, 2015

Bom Natal


Entremos, apressados, friorentos,
Numa gruta, no bojo de um navio,
Num presépio, num prédio, num presídio
No prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos. 
Entremos e depressa, em qualquer sítio,
Porque esta noite chama-se Dezembro,
Porque sofremos, porque temos frio.
Entremos, dois a dois: somos duzentos,
Duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
A casa, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos, despojados, mas entremos.
De mãos dadas talvez o fogo nasça,
Talvez seja Natal e não Dezembro,
Talvez universal a consoada.
DAVID MOURÃO FERREIRA

Bom Natal

Bom Natal

Tuesday, December 15, 2015

Poesia avulsa

INSÓNIA


Nem sequer uma mão morta
vem bater à minha porta

(Alexandre O'Neill)



Gelo fino à minha porta,
uma noite sem dormir:
nem sequer uma mão morta
para as janelas abrir...

Porque dentro do meu quarto
a tempestade do sonho
são palavras que reparto
e que esqueço quando ponho

numa forma de poema
no forno pela manhã,
sem que sequer a mão trema
de fúria ou febre terçã.

Esqueci o que ia dizer.
Bom, o dia vai nascer.






Friday, December 11, 2015

NÃO TENDO OUTRO MODO DE ENVIAR A TODOS E A CADA UM DOS MEUS AMIGOS VOTOS DE BOAS FESTAS, REQUENTEI ESTES VERSOS, QUE PEÇO LEIAM A BEBER UM BOM VINHO


É em vão? Talvez o seja.
Estarão fora de moda:
versos em que me reveja,
como saudade da prosa*...


Não sei porque vou teimar
na redondilha maior,
quando o verso vai saltar
dentro de um computador

e partir ao vosso encontro
na rede da internet,
como anacrónico monstro
que não sabe nem promete.

É em vão? É, certamente.
Mas ele há vícios piores!
Seja pois este presente
para os meus poucos leitores...


*citação de Manuel António Pina "poesia, saudade da prosa"

Thursday, December 3, 2015

Árvores


Um livro, um filho, sim, mas porquê uma árvore?
De um livro e de um filho tudo se pode esperar e desejar,
de uma árvore apenas que cresça,
que se multiplique laboriosamente em folhas
e que no outono as deixe cair por terra
para receber o dom
do inverno.