NUMA NOITE DE AGOSTO SOBRE A RIA DO ALVOR
(à Elisabeth Enders e à Lena Abreu)
Gritam grilos na noite serrilhada, cosidos a ela
como lantejoulas
gritam grilos como as estrelas
no infinito imaginado:
a invisibilidade dos números
faz os brilhos
um gato passa no seu passo lento e fino
um gato temerário que me fita
um comboio corta a noite correndo
pelo som que faz
o romper do ar que há na sua voz
na sua voz
Velocidade é tempo e o comboio é a sua
mais perfeita imagem
- tudo o que corre ocorre no sentido inverso
à marcha do comboio
no sentido inverso à terra, ao seu relógio,
pois que a velocidade é tempo e o comboio
é dela a mais perfeita imagem
Os comboios que eu amo não sabem de onde vêm
perdem-se na noite e refocilam como portentosos sonhos
pelos campos espalham uma quimérica limalha
dispersam-na e refocilam, portentosos bisontes
pois que algo no comboio livremente o toma
como as obstinações, a febre
e porque é febre a pressa que o acirra
(Maria Andresen, "Lugares,3", Relógio d'Água, Lisboa, 2010)
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há algo de duro neste poema, talvez a sua sonoridade desagradável resultante de palavras que chocam umas com as outras:"GRItam GRIlos"; "passa no seu passo"; "refocilam"(2 vezes); "espalham limalha"; "acirra"; palavras repetidas, um excesso de assonâncias que dão em dissonâncias e um uso de palavras raras e pouco adequadas à linguagem e sonoridade poéticas.
ReplyDeleteA que coisa ou ser se refere o "o" pronominal do verso 24? li várias vezes e não consigo encontrar o antecedente. Já o "o" do verso 26 possivelmente refere-se a comboio.
Ao contrário do bom poema anterior, posso dizer que não gosto desta poesia.