Thursday, May 10, 2012

Os portugueses

Esta GenteEsta gente cujo rosto
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco

Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis

Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre

Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
É a gente em quem
Um país ocupado
Escreve o seu nome

E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada

Meu canto se renova
E recomeço a busca
De um país liberto
De uma vida limpa
E de um tempo justo

Sophia de Mello Breyner Andresen, in "Geografia"

3 comments:

  1. É inegavel o seu sentido de oportunidade, não me canso de ler este poema meu deus como é atual... Obrigada por partager.

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  2. A velha senhora sonetilhou logo, em raiva e palavrão, ao ler-lhe, eu, este post. mas não deixou enviar nada, por não querer, disse, 'rimalhices-porcaria / junto ao que é mesmo poesia/ da minha amada sophia' . diz-me agora, hesitante, que posso mandar (pus vígulas, à revelia):

    foi em sessenta e sete
    que li, eu, da sophia,
    o seu 'geografía'.
    a raiva que me mete

    rever cá, hoje em dia,
    murcho e morto o cravo,
    os tais rostos de escravo
    pisado, em agonia

    e à fome a morrer.
    país reocupado,
    de abutres infestado?

    não pode, porra, ser,
    que o povo virou bravo:
    cabrões, vão-se foder!

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