Sunday, April 20, 2014

Poesia e diplomacia: Tiago Araujo

O meu jovem colega diplomata Tiago Araújo, colocado em Londres e de mudança em breve para Viena, é autor de vários livros de poesia. O seu último livro, "Respirar debaixo de água" (Averno, 2013) acaba de ser objecto, esta semana, de uma elogiosa recensão do "Público". Fica aqui um poema desse livro, com um abraço ao Tiago Araújo.

a vida das marionetas termina aqui
onde a mão hábil desenlaça nós de gravata
ao fim da tarde.
depois outra máscara substituirá essa máscara
igualmente verdadeira.
a personalidade, como a roupa, adequada a cada
circunstância, a cada grupo de pessoas
nos dias que recuam e regressam sem
rebentação, durante muito tempo
escrevi o diário no teu corpo, nada
de relevante existe para além dele, apenas
alguma falta de tempo e duas ou três crianças
a correr em volta de outro corpo
treinado para o ilusionismo.
agora, ao fim da noite, com os quartos povoados por
vultos destroçados num sono profundo,
já não interessa quem sou ou os jogos que invento
para ganhar tempo e me manter acordado.








3 comments:

  1. Estava a pensar que de alguma forma a poesia é a forma mais diplomática de atenuar o impacto da dor e sofrimento da constatação de que nada somos e não somos nada, de tirar fel à amargura e acidez ao descontentamento.
    Por outro lado a diplomacia oferece as palavras mais frias em algodão em rama ,protelando a exposição imediata do pragmatismo das intenções negociais, assim como o oculto dos significados na poesia..

    Gostei do poema.

    "durante muito tempo
    escrevi o diário no teu corpo,

    agora, ao fim da noite, com os quartos povoados por
    vultos destroçados num sono profundo,



    já não interessa quem sou"

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  2. entre o regresso a casa pelo fim da tarde, talvez com algumas demoras no transito nas ruas, e a noite e o sono em casa, o que vemos é uma casa talvez uma familia talvez uma profissão talvez um país talvez tédio e rotina talvez cansaço talvez vontade de adormecer profundamente quem sabe o que haverá que inventar para suportar o ofício e os dias, serão ou não os personagens deste quotidiano bonecos movidos a fios? vejo que não se consegue ver pelas janelas dessa casa, saberia mais sobre os cenários, e o que se passa no outro tempo, o despertar e os gestos matinais o sair o começar os trabalhos e o dia, pois isso está implicito, falar da tarde e da noite é falar da manhã e do dia, pois haverá que ler outras peças do tiago araujo para ver os outros actos falo dos das peças teatrais, pois de drama se trata no poema, personagens tempos cenários sentimentos gestos máscaras, marionetas no palco da casa, vejo do meu sitio uns 5 actores e fala se de outros que não estão presentes pois fico por aqui, etc etc

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  3. Constato com alegria que uma nova geração de poetas diplomatas está pronta a receber das mãos dos seus antecessores a chama da Poesia.
    Não conheço Tiago Araújo mas quero, na esperança de que dele tome conhecimento, um abraço de admiração.

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