Wednesday, September 5, 2012

Maus conselhos

Não olheis a pormenores,
pensai tão só por conceitos:
a esquecer males menores
espantamos nossos defeitos.

Esperai calmos em casa
que o destino bata à porta:
por faltar um golpe de asa
não fica a ideia morta.

O destino marca a hora,
a sorte não diz que não:
vamos pela estrada fora,
sigamos na contra-mão.


5 comments:

  1. O titulo é um daqueles afrodisiacos que incita a beber/ler com sofreguidão, mas depois tanta suavidade e bom senso face ao contexto atual...
    Talvez aí resida o cariz pecaminoso os seus maus conselhos são para seguir.

    Tem assim... Um leve leve aroma e um indelével indelevel laivo a
    Rene Char

    Como sempre interessante.

    ReplyDelete
  2. o autor inglês chesterton afirmou que "devo o meu sucesso ao facto de ter sempre escutado educadamente os bons conselhos dos outros, para depois fazer exactamente o contrário".
    «I owe my success to having listened respectfully to the very best advice, and then going away and doing the exact opposite».
    claro, g.k. chesterton, 1873-1936, era um humorista.
    já que estamos não só em materia de conselhos mas tambem de poesia, o mesmo autor disse ainda uma curiosa verdade que faz pensar: "poets have been mysteriously silent on the subject of cheese."
    em que ficamos? relativamente aos maus conselhos do poema, o unico verdadeiramente arriscado, portanto péssimo, é o de ir em contramão na estrada, se levado à letra, em sentido figurado há que pensar..; os outros sigo-os incondicionalmente.

    ReplyDelete
  3. Ai Alcipe essa do contra mão é que me agrada. Como peão da vida- devia haver peã - cada vez gosto mais de andar em sentido contrário. Porque será?

    ReplyDelete
  4. A velha senhora desatina e rima - 'n'importe quoi!':

    como não helena irmã
    pois se há peão há peã
    campeão e campeã
    contramão e contramã

    ReplyDelete
  5. não é alvaro de campos como pensei ao recordar versos que a leitura dos maus conselhos me fez procurar. é outro o poeta e percebo agora que este poeta quando recusa os convites para ir por um caminho o que afirma é a sua forte intenção de ir na contramão:

    "Vem por aqui" — dizem-me alguns
    estendendo-me os braços...
    seguros de que seria bom que eu os ouvisse
    quando me dizem: "vem por aqui!"
    eu olho-os com olhos lassos
    e cruzo os braços
    e nunca vou por aí
    ...............................
    o mais que faço não vale nada.
    ...............................
    como, pois, sereis vós
    que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
    para eu derrubar os meus obstáculos?...
    .....................................
    ide! Tendes estradas,
    tendes jardins, tendes canteiros,
    tendes pátria, tendes tetos,
    e tendes regras, e tratados, e filósofos e...
    .......................................
    que ninguém me dê piedosas intenções,
    ninguém me peça definições!
    ninguém me diga: "vem por aqui"!
    ....................................
    Não sei para onde vou
    Sei que não vou por aí!
    .................................
    (há nos olhos meus ironias e cansaços)
    cruzo os braços,
    e nunca vou por ali...
    a minha glória é esta:
    criar desumanidades!
    não acompanhar ninguém.
    ...................................
    Não, não vou por aí! Só vou por onde
    me levam meus próprios passos...
    se ao que busco saber nenhum de vós responde
    por que me repetis: "vem por aqui!"?

    ReplyDelete