Caspar David Friedrich
1.
Escrever porque a chuva entretém o ócio
e afinal a memória do mundo era tão frágil
como a nossa precária vida. Escrever poesia,
porque nela o instante vem morrer, desfazer-se,
como as ondas na praia que a chuva agora esconde
- e a poesia é então o modo de extrair da tagarelice do quotidiano
não a pepita de uma ideia, mas a morte de um instante
no seu próprio acontecer. Olho para o nevoeiro que esconde a praia
e penso que a poesia teve sempre por alvo o seu fim,
soubesse ou não.
2.
As conchas que guardavas em colecção
foram desarrumadas e dispersas,
por isso todos os nexos se perderam
e não era a poesia que te podia oferecer
qualquer nova ligação entre as coisas do mundo.
A poesia desarruma,
é como o amor: a paixão
nega o conhecimento e a arte maior
sucumbe ao instante e às passagens.
Uma casa velha na praia,
onde nada, nada, se guardou
e só as marés se repetem.
Como o amor.
Hummmmm que bonito.
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