Saturday, April 28, 2012

25 de Abril

Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando
no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una picolla... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indefectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não ilumina também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.

Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não: brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui
no meio de nós.
Brilha."


Jorge de Sena, Fidelidade (1958), Moraes, Lisboa

Wednesday, April 25, 2012

A Holanda ou Hollande?

Preocupa-nos mais a Holanda do que Hollande, diz o Wall Street Journal.

A verdade é que o que se está a passar na França e na Holanda, com Marine Le Pen e com Gert Wilders, vem realçar a tendência europeia: quando a resposta social ao afogamento da economia e da sociedade não vem mais da esquerda, é a direita anti-liberal que assume este papel histórico e vem protagonizar as reivindicações populares. Vimos isso bem nos anos 30.  E a girouette Sarkozy já assumiu plenamente esse movimento, passando do bling-bling liberal para a austera França dos verdadeiros trabalhadores, dos valores cristãos, da família e de uma nação de fileiras cerradas contra os estrangeiros.

Hollande será a resposta à Holanda?


Tuesday, April 24, 2012

Fazes-nos falta


Eppur si muove!


For over two years, the mainstream political elites of Europe have been battling to save the single currency, seeking its salvation in a German-scripted programme of austerity and legally enshrined fiscal rigour that curbs the budgetary sovereignty of elected governments.
In elections in France on Sunday, in the Royal Palace in The Hague on Monday, and on Wenceslas Square in Prague on Saturday, a democratic backlash appeared to be gathering critical mass as the economic prescriptions of the governing class collided with the street and the ballot box. The collision looks likely to bring down three European governments.
Mark Rutte, the centre-right Dutch prime minister, threw in the towel on Monday, submitting his resignation to Queen Beatrix after seven weeks of fruitless haggling over colossal spending cuts, which are required to comply with new European rules he has done much to design.
After the biggest popular protests in Prague since the velvet revolution brought down communism, the rightwing government of Petr Necas, close allies of David Cameron, teetered on the brink, because of unpopular spending cuts as well as sleaze.
Most crucially of all, the Sarkozy era in France looked to be over, having dazzled briefly and faded fast.
"There's a new uncertainty," said Paul De Grauwe, a leading Belgian economist. "Now we will have to see what will happen with the fiscal pact, and how the markets react."
Guardian de hoje, 24/4/2012

Sunday, April 22, 2012

Orwell's 1984 revisited

Big markets are watching you!

Saturday, April 21, 2012

Brighton, manhã


Esquerdas

Martin Kettle no "Guardian" comenta assim a atitude de reserva céptica com que os trabalhistas britânicos encaram a provável vitória de Hollande em França:  "desde 1791 que a esquerda britânica e a esquerda francesa andam muito separadas".

Nem para todos foi assim: Thomas Paine, Shelley, até Wordsworth, na sua juventude (depois arrependeu-se), vibraram com a Revolução Francesa.

A esquerda britânica, entre os escombros da Terceira Via e a alegria da City pela ruína geral e pelas especulações particulares, procura um sentido para existir. E se é certo que a amargura pode ser um bom terreno para a lucidez, não é menos certo que a ausência céptica de qualquer projecto pode abrir o terreno aos mais exacerbados extremismos e às mais perigosas ilusões.


Friday, April 20, 2012

Passagem por Brighton




A grandeza deles fez-se do que foram perdendo: primeiro o fulgor do Império, depois a exigência de uma sociedade decente.  

Monday, April 16, 2012

Quando a evidência está nas coisas e a inteligência não está nas pessoas


José António Saraiva:
À minha frente, no elevador, está um rapaz dos seus 16 ou 17 anos. Pelo modo como coloca os pés no chão, cruza as mãos uma sobre a outra e inclina ligeiramente a cabeça, percebo que é gay.

(O SOL, 13/4/2012)

Sunday, April 15, 2012

Casa na noite



Qu'une place soit faite à celui qui approche,
Personnage ayant froid et privé de maison.

Personnage tenté par le bruit d'une lampe,
Par le seuil éclairé d'une seule maison.

Et s'il reste recru de d'angoisse et de fatigue,
Qu'on redise pour lui les mots de guérison.

Que faut-il à ce coeur qui n'était que silence,
Sinon des mots qui soient le signe et l'oraison,

Et comme un peu de feu soudain la nuit,
Et la table entrevue d'une pauvre maison?

(Yves Bonnefoy, Du mouvement et de l'immobilité de Douve)

Saturday, April 14, 2012

Tim Tim na Alsácia


Casa





O que foi teu e o que juntaste à vida,
tudo te mostra a casa iluminada:
no fim do caminho a luz estremecida,
no rasto dos teus passos a morada.   

Sunday, April 8, 2012

Friday, April 6, 2012

Bonjour les choses d'ici bas


Je rentre à la maison


Unreal city


Quadras da noite

Um poema faz-se à vida
sem asco nem fantasia;
tanta coisa adormecida
não se quis dar em poesia.

Tantos restos de viver
e em poesia pouco sobra:
deixa o tempo adormecer
no que falta a uma obra.


Quem é?

«*** é um pensador e até um autor de textos marcadamente literários. Os seus discursos são peças de rigor e podem figurar em qualquer antologia de literatura. Já é tempo de deixarmos os mortos aos mortos e tratar de os integrar no seu tempo. Sabemos, como dizia Zweig no seu belíssimo O Mundo em que Vivi, que "é mil vezes mais fácil reconstruir os factos de uma época do que a sua atmosfera emocional". Deixar de lado a apologia e a catilinária anti-***ista, deixar *** morrer como homem, eis o melhor caminho para lhe apreender o espírito e estudá-lo enquanto um dos mais importantes marcos da cultura política (e literária) *** do século XX. Só os patetas, os facciosos, os labregos do espírito o não querem ver.»


O texto refere-se a um autor historicamente incompreendido:


1- Hitler, visionário claustrofóbico alemão, criador da ideia do Lebensraum?
2- Brasillach, poeta francês, autor da máxima "tuer tous les juifs et ne pas épargner les petits"?
3- Salazar, catedrático português, autor da popular expressão "uns safanões dados a tempo"?
4- Mussolini, melodista italiano, autor da canção Facetta nera, um hino à beleza da mulher negra?
5- Estaline, reputado académico russo, autor de O Marxismo e os Problemas da Linguística?


E os patetas, facciosos e labregos somos


- nós?


(O texto utilizado é do blog Combustões, citado pelo blog Portugal dos Pequeninos)







Dentro da noite

Será que a noite para poder dormir
me pede a mim uma gota de água?


(Eugénio de Andrade)


Deixa entrar a noite
nas janelas brancas
no sonho não dito
de cor esperança.

Deixa vir a noite
dentro da lembrança
acender o fogo
na raiz mais funda

da razão que sonha
fulgor e mudança.





Wednesday, April 4, 2012

Posso ler os blogs mais cretinos esta noite

Blogues de censores,
baba de buldogues,
outros estertores,
notas de snobes.

Certa blogosfera,
paisagem prevista:
vive, minha terra,
há mais quem resista.

Baba de furores,
palavras perdidas:
ajustes maiores,
contas esquecidas.

Basta não os ler,
dizes, é verdade.
Mas o dó de os ver
dá raiva à vontade,

nossa liberdade.